terça-feira, outubro 11, 2011

1001 coisos











Pois é, lá passou mais um ano e o rei ainda vai nu. De alguma forma dizer que vai nu parece-me pouco. Ou nos anos passados ainda tinha uns trapitos ou agora tem uma figura mais grotesca, do tipo homem invisível (ou Robbie Williams no Rock DJ), no qual a pele já desapareceu também e já só vemos um monte de entranhas ambulantes.
Para quem não faça ideia do que se passou, no passado Sábado estive no CCB com o Coro de Câmara do IGL para participar na iniciativa 1001 músicos, a "festa das escolas de música" na qual estão "mil e um jovens músicos juntos na grande celebração da música" (sic, ou será sick?). Esta iniciativa, começada pelo Ministério da Educação da outra senhora, Maria de Lurdes Rodrigues, pretende apresentar o trabalho das escolas de música ao público. A falha óbvia de ser um concerto nas promeiras semanas de aulas, quando os alunos acabaram de estar afastados das escolas durante alguns meses não parece ter afectado o ministério e levá-lo a reconsiderar a data. O facto de os sucessivos governos estarem a fazer o seu melhor para destruir o ensino das artes e a vida cultural em geral não parece afectar as escolas, que continuam a degladiar-se pela honra duvidosa de se apresentarem no CCB umas para as outras (este ano, que eu tenha tido conhecimento o ministro não nos brindou com a sua presença). Será por ser professor de Canto Gregoriano que me vem à cabeça a imagem dos cristãos na arena para divertimento dos nobres romanos que muitas vezes teriam mais que fazer do que olhar para a arena? Será excessivo ver um paralelismo com esta situação em que uns lutam pela sobrevivência e outros se divertem quando têm tempo para isso e acham que a sobrevivência de alguns se deve a magnanimidade de uns poucos? Se estiver a ser dramático não me liguem! Sou artista...
A verdade é que, apesar das queixas e das minhas sugestões sucessivas de manifestações públicas de desagrado, lutos públicos ou concertos em silêncio, ninguém me liga. Sou selecionado para a apresentação porque a qualidade ainda é valorizada por alguns dos pares e lá estou porque os pares acham que é importante aparecer e fazer o melhor possível. Se agradarmos aos senhores, talvez não seja tão mau. Se estivermos entre os melhores, talvez César não vire o polegar para baixo. Devo ser o único a achar que nos estão a distrair com actividades para não vermos o que se passa; todos os que estão na arena morrem mais cedo ou mais tarde, mesmo que dêem um bom espectáculo.
Ao ler isto alguns pensarão, mas ele está a queixar-se de quê? Tem trabalho na área que escolheu, tem qualidade suficiente para ser seleccionado para um evento selecto numa das maiores salas do país! Pois, mas seria bom que tudo isto fosse apreciado por quem organiza. Que os motivos fossem transparentes. Que todo o processo fosse digno. O dia em que deixe de fazer o meu trabalho com o maior empenho, que deixe de apreciar a qualidade sublime e transcendente da música que apresento (neste caso dois dos maiores compositores da História, Bach e John Lennon), que deixe de saber o privilégio único que é fazer grande música em conjunto com outros e ajudar um grupo de jovens a evoluir como artistas e seres humanos e a descobrir este privilégio será o dia em que mudo de profissão. Ainda assim, não é disto que se trata.
Enfim, o rei ainda vai nu, a banda ainda toca enquanto o Titanic se afunda e nós ainda cá andamos, a cantar umas cantigas...

P.S. O penúltimo paragrafo é a mais pura das verdades e não podia apreciar mais a dedicação, empenho e profissionalismo do Coro de Câmara do IGL que NUNCA falha. Apesar do mau feitio, obrigado...

P.P.S. para verem que não estou a ficar doido e rabujento ao aproximar-me dos 40, aqui está o que escrevi há um ano

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