sábado, julho 18, 2009

Advogado do Diabo

O Coordenador Nacional para a Infecção VIH/sida, Henrique Barros, disse hoje que “não há razões” para excluir qualquer grupo de pessoas da doação de sangue e lembrou que já não existem grupos de risco, uma vez que os homossexuais não têm uma taxa de HIV superior aos heterossexuais. Reagia assim a uma resposta do Ministério da Saúde (MS) ao Bloco de Esquerda onde se lia que a recusa de dádivas de sangue dadores masculinos que declarem ter tido relações homossexuais tem fundamentação científica.

A questão já não é nova. Já pelo menos desde 2005 que as associações de defesa dos direitos dos homossexuais se queixam de ser discriminados nas dádivas de sangue. Com base em denúncias concretas de recusa, o Bloco de Esquerda enviou ao ministério um requerimento perguntando sobre a sua veracidade e sobre a disponibilidade da tutela para “rever” a interpretação “discriminatória”.

Na resposta do ministério, de 13 de Julho, citada pela Lusa, afirma-se: “A necessidade de garantir que os potenciais dadores não têm comportamentos de risco que, em termos objectivos e cientificamente comprovados, podem constituir uma ameaça à saúde e à vida dos potenciais beneficiários, leva à exclusão dos potenciais dadores masculinos que declarem ter tido relações homossexuais.”

O ministério garante que tal “necessidade” não significa uma discriminação em função da orientação sexual, mas “unicamente” um controlo sobre os comportamentos de risco dos dadores, “o que se comprova pela circunstância de os homossexuais do sexo feminino poderem ser aceites como tal”.

O Ministério da Saúde admite que a “restrição” é “justificada cientificamente pelas elevadas taxas de prevalência nos homossexuais do sexo masculino de doenças graves transmissíveis pela transfusão de sangue”, noticiou hoje o Jornal de Notícias.

O coordenador nacional para a Infecção VIH/sida, Henrique Barros, diz que “enquanto grupo, os homossexuais têm prevalência mais alta de algumas infecções, nomeadamente de hepatite”. Mas, acrescenta, isso não é razão para “atacar as pessoas por grupos, por segmentos, mas apenas ver individualmente se têm comportamentos de risco. Isso acontece entre hetero e homossexuais”, realçou à Lusa o responsável.

Henrique Barros concorda com o que chama o princípio da precaução, mas em relação a comportamentos de risco e não a grupos de risco. “Não é aceitável que se discrimine um grupo, como os homossexuais”, sustenta.

O último relatório da Coordenação Nacional para a Infecção por VIH/sida, relativo a 2008, refere terem sido recebidas no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge notificações de 2668 casos de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH), nos vários estádios, dos quais 1201 (45 por cento) diagnosticados nesse ano.

Dos casos notificados em 2008 (num total de 1201), a categoria de transmissão “heterossexual” representou mais de metade (57,6 por cento), a transmissão associada à toxicodependência representou 21,9 por cento do total notificado e os casos homo/bissexuais apenas 16,8 por cento.



Não te Prives diz que viola a Constituição

Em comunicado de imprensa a Não te Prives - Grupo de Defesa dos Direitos Sexuais, escreve que “proibir homens homossexuais de doar sangue só por terem relações homossexuais é manifestamente uma prática discriminatória sem qualquer fundamento científico”, que viola a Consituição portuguesa, onde se proíbe a discriminação “em função da sua orientação sexual”.

A associação reforma que “a homossexualidade não é sinónimo de comportamentos de risco, assim como a heterossexualidade não é garante da sua ausência.”

Nesta matéria têm-se observado sucessivos avanços e recuos. Após vários anos de denúncia, designadamente pelo movimento que representa as pessoas lésbicos, gays, bissexuais e transgénero (LGBT), em finais de 2005 o Instituto Português de Sangue estipulou o fim da proibição de doação de sangue por parte doadores homossexuais masculinos sustentando que, de facto, se tratava de uma estigmatização sem fundamento científico. Contudo, e como por várias vezes o movimento LGBT alertou, em muitos hospitais a prática continuava a excluir homossexuais da possibilidade de doar sangue, lê-se no comunicado.

"Agora, o Ministério da Saúde assume aquilo que a prática de muitos hospitais vinha provando e que várias organizações denunciavam: uma prática discriminatória que põe de lado milhares de potenciais doadores/as quando existe sempre necessidade de sangue." A associação reclama então a revisão desta orientação para que a todos os dadores seja perguntado “se têm comportamentos de risco”, em vez de se perguntar qual a sua orientação sexual.


In Público

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