quarta-feira, maio 03, 2006

Marina de Faro

















Nesta manhã cresci
a andar à chuva


Bordado a cinza, o dia gotejava
e desdobrava-se em brandas aguarelas.

Quanta chuva irá vogar ainda,
tão fina e quase meiga, por estas cais
desertos, na pele que sem tremor
enfrenta a brisa, no demorado olhar
que se comove com as vislumbradas
gotas mais minúsculas?

Propaga-se, bem ao longe, a escuridão:
vem já nessas gaivotas que ladeiam
-precisas, bem despertas, circundantes-
os oscilantes mastros que vigiam
como à espera de sombra inadiável
e nela, tacteante, um fio da mágoa.

Quantas ondas irão ruir ainda
contra o perfil tão nítido, ainda que breve,
destes barcos serenos, quase imóveis,
dormentes, mas expectantes
frente ao tear de bruma que ameaça?

Neste dia sem sul a chuva enlaça
um recesso da alma e a lentidão
dos passos


João Rui de Sousa

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